Foi terminando o ontem e eu, lentamente, fui me distanciando de minha sombra, como se nenhum mínimo controle eu mesmo exercesse sobre mim. É que os últimos momentos não me foram felizes. Restou-me a mim totalmente dilacerado e rendido diante da natureza angustiante do ego. Chovia, muito e um bocado mais, a cada relance do mundo espiado por minha janela. Inclusive, o que parece permanecer é o observar. Não sou mais observado. Ninguém me percebe. No entanto, eu nunca antes percebi tanto. Em verdade, acho que percebo tudo, agora.
De longe sentia o asfalto molhado, ele que me mantinha frio. Sim! Ainda estou gelado! E quem está quente neste inferno gélido de toscas compreensões e nenhuma tolerância?
Somos todos tão desiguais e insuportáveis. As minorias se agregam e se multiplicam, no fim somos todos minoritários. O coletivo é vazio e caótico como o desespero. A alegria findou-se por ser cristal raro, digitalizada e exposta nos murais do Facebook, em uma mera e insensata tentativa de prolongamento. Esquecem-se do tempo. Ele tudo corrói. Não restará pedra sobre pedra, byte sobre byte.
Quando eu me pergunto por que disse isso? E, quando disse, de que adiantou?
Num tempo tão, indeterminadamente, curto e num espaço tão, estreitamente, infinito, tem sido um prazer intenso compartilhar comigo mesmo, e comigo apenas, as amarguras dessas dimensões. Ninguém , nem mesmo você, chuva companheira que me escuta com sua paciência duvidosa. Somos apenas massa. Temos pouca força e quase nenhuma aceleração. Somos impotentes. E onde devo aderir? Não parece haver espaço no desfile de corpos perfeitos de estereótipos inexequíveis e patológicos. Esta inadequação, antes fosse pessoal, mas assola o meu tempo. Criou-se um mundo, onde o tempo já não é suficiente.

Os felizes, os mais felizes, sabem pouco. Dessa forma, sublimam a existência que se apresenta como um processo de desconstrução da felicidade inata. Toda alegria, depois da realidade, é hipocrisia. No máximo, um ensaio de retorno. Nada mais para sempre.
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